segunda-feira, 18 de junho de 2012

Yakissoba (por Felippe Pompeo)

"O prazer dos banquetes não está na abundância dos pratos e, sim, nos amigos que nos acompanham à mesa"




Pompeo mais uma vez, nos presenteia com uma linda foto (de aguçar todos os sentidos e causar inveja em quem, como eu, AINDA não almoçou) e um texto igualmente delicioso

Simples como todo prazer deve ser...



O melhor Yakissoba do mundo é aquele que vende na Praia Grande, sujo e encardido. Toda vez que eu faço um, é naquele que penso. Gosto também do que o Lig Lig entrega. Não gosto do que vende na Feira Hippie (eles carregam demais na pimenta do reino, abrasileirando demasiadamente a receita). Aquele que vende congelado no mercado é um insulto. Então tive que aprender a fazer o macarrão chinês – e digo já: o meu é muito, muito bom.

Entre erros e acertos – afinal, é disso que se trata cozinhar – cheguei a minha noção exata de um bom Yakissoba. Lembro-me de tantas e tantas vezes em que salguei o prato ao ter esquecido da mera noção de que o sal vem do molho de soja.

Experimentei todas as massas que do mercado e lá vai minha primeira dica: a melhor é o macarrão instantâneo, aquele que parece miojo. Há uma marca da embalagem verde que vem 500 gramas e está escrito “Macarrão para Yakissoba” – infelizmente a marca me foge da cabeça, mas vende em todos os mercados.

Outro enigma é o molho. Aprendi sobre molhos mães e o do Yakissoba é um danadinho que começa com osso bovino assado por 40 minutos no forno e depois vira um caldo de carne pra lá de saboroso. Mas isso dá muito trabalho e gasta muito gás.

Tentei, certa vez, cozinhar o macarrão com água e shoyo para ver se dava aquela cor. Errado. Fiz de tudo. Até que a Sakura lançou o “molho para Yakissoba”, e posso te garantir que é o melhor que existe. Outro segredo desse prato chinês é saber a quantidade de legumes e carne a ser utilizado. Vocês irão perceber que toda vez que eu der minhas receitas aqui, nunca irei colocar medidas e pesos, porque não é assim que eu faço. Aprendi com minha mãe que o olho é a melhor medida.

O que vocês têm que entender é que, no caso do Yakissoba – que vai bastante coisa – o segredo do sucesso é um pouco de cada. Um pouco de brócolis, um pouco de couve flor (corte-as bem pequenas, para ficar homogênio no fim das contas); um pouco de acelga e procure preservar em quadrados a parte grossa da folha, ela fica parecendo com cebola, é lindo; um pouco de repolho branco (nunca o roxo para esse prato – NUNCA) metade de uma cenoura grande ou uma pequena cortado do jeito que você quiser – eu preferi em chiffonade, que é tipo tiras – dá um Google que ajuda; cebola também em chiffonade – eu sei picar e cortar nas técnicas porque fiz gastronomia, mas é só ver um programa de culinária na TV que você aprende ou dar o Google novamente; um pouco de pimentão verde também vai bem, cortado em quadrado; usei coxão mole em tirinhas de mais ou menos um centímetro por cinco; e quase todos os meus preparos que têm molho em abundância eu uso cebolinha cortada (não pique, apenas corte) pois a cebolinha pra mim é sagrada.

Antes de mais nada tempere a carne (se estiver inseguro com a quantidade, use umas 300 gramas que tá massa) com ¼ do molho Sakura para Yakissoba e só, não precisa de mais nada.

Aqueça uma frigideira com óleo (não azeite, Yakissoba é óleo do que você quiser, menos oliva). Deixe esquentar bem e jogue a carne lá. Delicia-se com o tchóóóu e veja a reação dos presentes na sua casa ao sentirem o cheiro quase agonizante. Mexa um pouco só para disponibilizar bem a carne na frigideira. 

Depois de uns dois minutos mexa pra valer e abaixe o fogo. O molho deve reduzir. Aí vai a sequência – cebola (deixe ela murchar); depois cenoura, brócolis, couve flor e pimentão ao mesmo tempo. Coloque o restante do molho sakura (sim, tudo, deixe seu yakissoba encharcado) e tampe. Cozinhe até que os vegetais fiquem tenros. Some a acelga e o repolho e cozinhe mais um pouco. Depois disso tudo, use um pouco de glutamato se você gosta (eu adoro) -  o tal do Ajinomoto.

E um truque que aprendi meio que sem querer: se você não colocar o que eu vou dizer, esqueça tudo o que fez até agora – óleo de gergelim torrado, 2 colheres de sopa apenas, no final de tudo. Não se esqueça da cebolinha picada. Tampe e reserve. Cozinhe o macarrão (demora uns 4 minutos), escorra.

Enxugue bem a panela que usou para cozinhar o macarrão e aqueça umas colheres de sopa de óleo. Jogue o macarrão nesse óleo e frite mexendo bem (vai grudar um pouquinho, normal). E outro truque: é o molho que é jogado no macarrão e não o contrário, pois fica mais fácil de juntar tudo, mexendo, é claro. Sirva com prato raso, prato fundo, direto na panela... Do jeito que quiser.

Lembrando que é um prato um tanto salgado – uma coca-cola vai bem, ou um suco. Se você é corajoso coloque no seu prato (no seu prato hein!!!) uma boa quantidade de molho de soja e seja feliz pra sempre. 




Cozinhar é simples, mas dá trabalho. E cada prato tem o seu grau de trabalho. A dificuldade depende do quanto você está disposto a ficar em pé, não apenas na beira do fogão, mas também na beira da pia ou de uma bancada preparando seus insumos. Cortar, picar, lavar, arrumar, selecionar, comprar, improvisar. Tudo é uma grande soma de fatores prazerosos. Sim, cozinhar é pra quem gosta, e quem gosta sente prazer em estar na cozinha. 


Cozinhar também é pra quem gosta de comer, não apenas matar a fome. Do trivial ao elaborado, a alquimia que há dentro de uma panela em ebulição remete aos contos de magos e bruxas fazendo suas poções do amor. Você conquista com uma garfada, faz as pessoas gemerem literalmente ao testarem seus sentidos com a conhecida explosão de sabores. Aquele maravilhoso “hmmmmmm” de olhos fechados, quase como um orgasmo, pra não dizer melhor que, e a gratidão eterna por participar desse momento único que é comer.

Comemos com os olhos, com o nariz e, por último, com a boca. Não é necessária uma apresentação estrondosa com aquele ramo de cebolinha ou uma pimentinha no canto do prato para ele ser bonito. 


Quantas vezes você abriu a panela da sua mãe e havia aquele frango ensopado saindo um vapor inexplicavelmente cheiroso? E isso é lindo! Até quando não se tem fome caímos na tentação de experimentar algo tão apresentável. Se não fosse assim, não haveria o riquíssimo comércio de comida em todo o globo e os franceses não seriam os mais astutos. E se não desse trabalho, não sentiríamos vontade de sentar-se à mesa de um restaurante e pagar pelo trabalho que não tivemos. 


Desde já, aquele prato fantástico que você comeu num restaurador de ânimo (vulgo restaurante) é perfeitamente possível de ser feito em sua casa. Lembre-se: há um cozinheiro lá dentro que muitas vezes está encarando o seu feito apenas como trabalho. É a coisa mais fácil do mundo perceber quando a comida foi feita sem vontade, sem carinho e sem dedicação – e pagar por isso é lamentável.

O trivial deve ser perfeito. Comer um arroz e feijão mal feito é imperdoável. Fritar um bife de alcatra deve ser de regra suculento (é claro que temos espaço para os erros, só assim aprendemos). 


Refogar uma cenoura ou um repolho; saltitar um frango em cubos com cebolas; assar batatas; fritar peixe; comer, comer e comer... Nosso dia a dia não nos dá muita opção na hora do almoço (até mesmo os mais afortunados que pagam uma grana para simplesmente fazer uma reunião de negócios à beira da mesa – veja bem, eles estão conversando sobre negócios, comida ali é necessidade do tempo escasso). É no jantar que você vai se dar bem. Abra uma garrafa de vinho, uma latinha de cerveja, um suco, uma coca ou mesmo um copo de água. Nem sempre será possível, é claro, porque se fosse sempre não teria graça alguma. Mas dê-se esse prazer, esse momento. Chame um amigo, o namorado, a namorada, o pai, a mãe, seja quem for. Comece cedo e não tenha pressa (embora que, com o tempo, você terá a facilidade de fazer grandes pratos em meia hora). Invente, crie, recrie, reproduza, compartilhe. 


Cozinhar é uma verdadeira forma de convívio e de agradecimento aos raros momentos prazerosos que a vida nos proporciona.

Bom apetite. 



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